SÓ...

Fugiu -  me , e eu aqui fico, mais e mais convencida de que sou inteiramente desprezada por ele . Mas por que não hei de ter coragem para lhe dizer com franqueza o que sei a respeito da sua traição? Será possível que eu estremeça a ponto de recear com a minha franqueza vê - lo fugir - me para sempre? ... Por que me há de faltar a energia quando me acho ao seu lado? A caso não será preferível uma completa separação a sofrer  essa meia felicidade , que vale menos que nenhuma? Amo - o muito , cegamente, mas já não me posso iludir: sei que ele tem lá fora uma mulher, um demônio que usurpou meu lugar e o amor de meu marido. Li as cartas dela , vi a sua fotografia, mas, precisarei porventura dessas provas? Ele próprio não acabou de declarar - me em face que eu já não lhe ofereço novidade alguma?... É quando se pode ser infeliz ! Mas que terrível desgraça a nossa !  Por que não havemos nós , mulheres  honestas, de possuir a arte de prender ao nosso lado aqueles que têm obrigação de nos amar?... Que estranha ciência possuirão as outras para conseguir dominá-los tão despoeticamente? ...Não serei porventura ainda bastante moça? Ou serei acaso tão feia que não mereça ser amada? Terei menos espíritos e menos encantos, do que qualquer uma dessas piratas da felicidade conjugal? E, dada a hipótese de que eu não tivesse tanta graça como elas, a minha dedicação, a minha virtude, o fato de pertencer só a ele , não devem valer nada a seus olhos?.... Ah! juro que se um professor mefistofélico quisesse me ensinar a arte diabólica dessas mulheres; se me prometesse instruir os mistérios das suas seduções, eu daria,em troca , todo o dinheiro de que me disponho! Ah! mas se assim fosse Leonardo seria o primeiro a condenar -  me e talvez ainda mais me desprezasse. 

(Teatro de Aluísio Azevedo e Emílio Rouéde) 

Lorrany Alves                                    

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